segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

118 - Curva de Hípias


"Qualquer um pode ser um matemático de primeira sem habilidade para fazer cálculos. E é possível ter um grande poder de cálculo sem ter a menor ideia do que é a Matemática."

Georg Novallis


Os matemáticos costumam inventar artifícios variados com o intuito de resolver problemas complexos ou até mesmo impossíveis por métodos tradicionais. Por exemplo, dividir um ângulo dado em três partes iguais apenas com régua não graduada e compasso  é impossível mas não a partir de curvas especiais. Uma delas é a curva de Hípias que não só resolve a questão da trissecção angular como também o da quadratura do círculo. A quadratura consiste em encontrar com os instrumentos euclidianos ( régua e compasso)  o lado de um quadrado de mesma mesma área que um círculo de raio conhecido.  

A curva de Hípias, curva exótica mais antiga conhecida, foi criada pelo grego Hípias de Elis com o objetivo de resolver o problema da trissecção. Outro grego, Dinóstrato de Atenas   e usando a mesma curva, solucionou a questão da quadratura . Por estes motivos, a curva recebeu o nome de trissectriz ou quadratriz de Hípias.


Definição


Uma curva diz-se mecânica quando seus pontos são gerados pela interseção de  figuras geométricas em movimento. É o caso da curva de Hípias.

Considere o quadrado a seguir. A curva é a trissectriz de Hípias. Observe que, em uma mesma vertical,  as ordenadas dos pontos desta curva são menores  que as ordenadas dos pontos do quarto de círculo . Realmente uma curva estranha. Veremos agora sua lei de formação.


Considere os seguintes movimentos. A reta move-se em movimento uniforme e vertical  até coincidir com a reta . No mesmo tempo que inicia seu movimento, a reta gira uniformemente e em sentido horário em torno do ponto até coincidir também com a reta   chegando ao mesmo tempo que a reta no seu movimento vertical.

Em um dado momento, seja [;A1B1;]  a posição da reta e a posição da reta . O ponto é a intersecção de [;A1B1;] e . O lugar descrito pelo ponto considerando todas as intersecções possíveis das retas e durante seus movimentos é a curva , a curva de Hípias.


Trissecção


A mais importante propriedade da curva de Hípias  é a proporcionalidade direta  do segmento com o ângulo ou a proporcionalidade direta do segmento com o ângulo . É o que permite a trisseção.

Teorema. O espaço vertical percorrido pelo segmento [;A1B1;] é diretamente proporcional ao ângulo formado pelo segmento e o eixo .

Demonstração.  O movimento do segmento e do segmento são uniformes, por definição.  Logo, podemos fazer e , onde é a velocidade linear de   e   a velocidade angular de . Assim,


caracterizando a proporção direta do espaço linear percorrido com do espaço angular percorrido .

Consequentemente é diretamente proporcional a .  É esta segunda  visão de proporcionalidade que normalmente é utilizado na trissecção. Passaremos a descrever o processo da mesma. Contemplem o diagrama.



Começamos dividindo o segmento nas partes iguais , e . Sejam , e os pontos da curva de Hípias que interceptam os segmentos horizontais [;A1B1;],   e , respectivamente. Assim, os segmentos , e dividem o ângulo hachurado de vértice em três partes idênticas.

Da mesma forma, de dividíssemos o segmento em partes iguais, então se dividiria o ângulo hachurado em partes iguais, ou seja, Hípias tinha conseguido algo muito além do que uma trissecção angular, que era um problema em volga e importante da sua época.


Equação Cartesiana e Polar




Vimos que é diretamente proporcional ao ângulo ou vice-versa. Tendo em vista que , temos

 

Para achar o valor da constante atribuímos   e verificamos que quando   então .  Logo,


Mas vejam que  . Assim, a equação cartesiana da curva de Hípias é dado na forma implícita


Para a equação polar, usaremos o raio da curva ( não confundir com o raio do quarto de círculo que é ) e o ângulo . Sabemos que . Fazendo e substituindo chegamos a equação polar da curva de Hípias:





Quadratura


 



Fazer a quadratura do círculo com régua e compasso não é possível porque o número não é construtível com estes instrumentos. Mas a partir do segmento limitado pela origem e pela curva de Hípias, a quadratura passa a ser possível. Porque? A resposta é que o valor de é uma função racional de . E como calcular ?

Da equação polar , tiramos



  quando . Aqui, temos o limite conhecido



Logo,  

Interessante observar que , onde é a constante de proporcionalidade direta de com o segmento

Para quadrar o círculo basta utilizar para construir um segmento do comprimento de que é de circunferência de raio Então, um retângulo de medidas e tem a mesma área que um círculo de raio . Para finalizar constrói-se facilmente um quadrado com área igual a este retângulo.


Natureza Oculta da Curva de Hípias


A equação cartesiana da curva de Hípias é implícita mas sua inversa não é. Trocando o pelo e vice-versa, temos:
 




Assim fica bem mais simples fazer o gráfico com esta equação. Fazendo vejam o ramo da curva de Hípias invertido pela troca de eixos.







Se a curva de Hípias, além da trissecção angular e da quadratura do círculo também resolvesse a questão da duplicação do cubo, então seria a curva mais genial já descoberta pois solucionaria todos os três problemas gregos famosos da antiguidade.



Referência Bibliográfica

História de Matemática, Carl B. Boyer, Editora Edgard Blücher LTDA

Referência na NET:

2 comentários:

  1. Excelente post, com muitas informações relevantes e de forma concisa. Parabéns pela postagem e pelo retorno ao blog.

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    1. Com exceção da reta e do círculo, a curva de Hípias é a mais antiga da História da Matemática. Ainda não tentei mais fiquei curioso para saber a equação paramétrica desta curva. Obrigado!

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