"Qualquer um pode ser um matemático de primeira sem habilidade para fazer cálculos. E é possível ter um grande poder de cálculo sem ter a menor ideia do que é a Matemática."
Georg Novallis
Os matemáticos costumam inventar artifícios variados com o intuito de resolver problemas complexos ou até mesmo impossíveis por métodos tradicionais. Por exemplo, dividir um ângulo dado em três partes iguais apenas com régua não graduada e compasso é impossível mas não a partir de curvas especiais. Uma delas é a curva de Hípias que não só resolve a questão da trissecção angular como também o da quadratura do círculo. A quadratura consiste em encontrar com os instrumentos euclidianos ( régua e compasso) o lado de um quadrado de mesma mesma área que um círculo de raio conhecido.
A curva de Hípias, curva exótica mais antiga conhecida, foi criada pelo grego Hípias de Elis com o objetivo de resolver o problema da trissecção. Outro grego, Dinóstrato de Atenas e usando a mesma curva, solucionou a questão da quadratura . Por estes motivos, a curva recebeu o nome de trissectriz ou quadratriz de Hípias.
Definição
Uma curva diz-se mecânica quando seus pontos são gerados pela interseção de figuras geométricas em movimento. É o caso da curva de Hípias.
Considere o quadrado a seguir. A curva é a trissectriz de Hípias. Observe que, em uma mesma vertical, as ordenadas dos pontos desta curva são menores que as ordenadas dos pontos do quarto de círculo . Realmente uma curva estranha. Veremos agora sua lei de formação.
Considere os seguintes movimentos. A reta move-se em movimento uniforme e vertical até coincidir com a reta . No mesmo tempo que inicia seu movimento, a reta gira uniformemente e em sentido horário em torno do ponto até coincidir também com a reta chegando ao mesmo tempo que a reta no seu movimento vertical.
Em um dado momento, seja a posição da reta e a posição da reta . O ponto é a intersecção de e . O lugar descrito pelo ponto considerando todas as intersecções possíveis das retas e durante seus movimentos é a curva , a curva de Hípias.
Trissecção
A mais importante propriedade da curva de Hípias é a proporcionalidade direta do segmento com o ângulo ou a proporcionalidade direta do segmento com o ângulo . É o que permite a trisseção.
Teorema. O espaço vertical percorrido pelo segmento é diretamente proporcional ao ângulo formado pelo segmento e o eixo .
Demonstração. O movimento do segmento e do segmento são uniformes, por definição. Logo, podemos fazer e , onde é a velocidade linear de e a velocidade angular de . Assim,
caracterizando a proporção direta do espaço linear percorrido com do espaço angular percorrido .
Consequentemente é diretamente proporcional a . É esta segunda visão de proporcionalidade que normalmente é utilizado na trissecção. Passaremos a descrever o processo da mesma. Contemplem o diagrama.
Consequentemente é diretamente proporcional a . É esta segunda visão de proporcionalidade que normalmente é utilizado na trissecção. Passaremos a descrever o processo da mesma. Contemplem o diagrama.
Começamos dividindo o segmento nas partes iguais , e . Sejam , e os pontos da curva de Hípias que interceptam os segmentos horizontais , e , respectivamente. Assim, os segmentos , e dividem o ângulo hachurado de vértice em três partes idênticas.
Da mesma forma, de dividíssemos o segmento em partes iguais, então se dividiria o ângulo hachurado em partes iguais, ou seja, Hípias tinha conseguido algo muito além do que uma trissecção angular, que era um problema em volga e importante da sua época.
Equação Cartesiana e Polar
Vimos que é diretamente proporcional ao ângulo ou vice-versa. Tendo em vista que , temos
Para achar o valor da constante atribuímos e verificamos que quando então . Logo, e
Mas vejam que . Assim, a equação cartesiana da curva de Hípias é dado na forma implícita
Para a equação polar, usaremos o raio da curva ( não confundir com o raio do quarto de círculo que é ) e o ângulo . Sabemos que . Fazendo e substituindo chegamos a equação polar da curva de Hípias:
Quadratura
Fazer a quadratura do círculo com régua e compasso não é possível porque o número não é construtível com estes instrumentos. Mas a partir do segmento limitado pela origem e pela curva de Hípias, a quadratura passa a ser possível. Porque? A resposta é que o valor de é uma função racional de . E como calcular ?
Da equação polar , tiramos
quando . Aqui, temos o limite conhecido
Logo,
Interessante observar que , onde é a constante de proporcionalidade direta de com o segmento
Para quadrar o círculo basta utilizar para construir um segmento do comprimento de que é de circunferência de raio Então, um retângulo de medidas e tem a mesma área que um círculo de raio . Para finalizar constrói-se facilmente um quadrado com área igual a este retângulo.
Para quadrar o círculo basta utilizar para construir um segmento do comprimento de que é de circunferência de raio Então, um retângulo de medidas e tem a mesma área que um círculo de raio . Para finalizar constrói-se facilmente um quadrado com área igual a este retângulo.
Natureza Oculta da Curva de Hípias
A equação cartesiana da curva de Hípias é implícita mas sua inversa não é. Trocando o pelo e vice-versa, temos:
Assim fica bem mais simples fazer o gráfico com esta equação. Fazendo vejam o ramo da curva de Hípias invertido pela troca de eixos.
Se a curva de Hípias, além da trissecção angular e da quadratura do círculo também resolvesse a questão da duplicação do cubo, então seria a curva mais genial já descoberta pois solucionaria todos os três problemas gregos famosos da antiguidade.
Referência Bibliográfica
Referência Bibliográfica
História de Matemática, Carl B. Boyer, Editora Edgard Blücher LTDA
Referência na NET:
Excelente post, com muitas informações relevantes e de forma concisa. Parabéns pela postagem e pelo retorno ao blog.
ResponderExcluirCom exceção da reta e do círculo, a curva de Hípias é a mais antiga da História da Matemática. Ainda não tentei mais fiquei curioso para saber a equação paramétrica desta curva. Obrigado!
Excluir